“Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas mãos, ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for. Porque todos, todos temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou perdoada.”

O autor nos presenteia ainda com casos de sua própria vida na época em que ficou exilado na Espanha, mas fala também acerca de outras pessoas: famosas ou anônimas, queridas ou odiadas, admiradas ou ignoradas e, cada uma delas, à sua maneira, é relevante e pertinente para a obra.
Não é por Galeano tratar de assuntos sérios que sua escrita é seca, ao contrário, a cada pequeno relato tive a sensação de ser abraçada… abraçada por sua sensibilidade em enxergar beleza nas pequenas coisas, abraçada por sua capacidade de ver a vida a partir de diferentes ângulos, abraçada por sua escrita tão certeira, tão firme e, ao mesmo tempo, tão poética e linda.
Poderia ficar por horas mencionando os sentimentos variados que O Livro dos Abraços me proporcionou, no entanto, prefiro citar este trecho da obra que diz muito mais que qualquer coisa que eu pudesse escrever aqui:
O mundo é isso, um montão de gente, um mar de fogueirinhas. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo.
Sobre o autor: Transcrevo um relato do livro no qual ele mesmo se apresenta:

“Assino Galeano, que é meu sobrenome materno, desde os tempos em que comecei a escrever. Isto aconteceu quando eu tinha dezenove anos, ou talvez apenas alguns dias, porque chamar-me assim foi um modo de nascer de novo.
Antes, quando era garoto e publicava desenhos, assinava Gius, por causa da difícil pronúncia espanhola de meu sobrenome paterno (meu tataravô galês se chamava Hughes, e aos quinze anos fez-se ao mar no porto de Liverpool e chegou ao Caribe, à República Dominicana, e tempos depois ao Rio de Janeiro, e finalmente a Montevidéu. Em Montevidéu atirou ao arroio Miquelete seu anel de maçom, e nos campos de Paysandú cravou as primeiras cercas de arame farpado e fez-se dono de terras e gentes, e morreu há mais de um século, enquanto traduzia Martin Fierro para o inglês).
Ao longo dos anos escutei as mais diferentes versões sobre essa questão de meu sobrenome escolhido. A versão mais boba, que ofende a inteligência, me atribui uma intenção antiimperalista. A versão mais cômica supõe fins de conspiração ou contrabando. E a versão mais fodida me converte na ovelha vermelha da família: inventa para mim um pai inimigo e oligárquico, no lugar do pai real que tenho, que é um sujeito bacana que sempre ganhou a vida com o trabalho ou com a boa sorte que tem na loteria.
O pintor japonês Hokusai mudou de nome sessenta vezes para celebrar seus sessenta nascimentos. No Uruguai, um país formal, teria sido enjaulado como louco ou perverso simulador de identidades.”
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